Contos de Arkesia: Tortoyk

11 de Outubro de 2021
|
Atualizações

“Veja o que encontrei!”. Proclamou Arthur enquanto ele adentrava com orgulho a casa de sua família, tendo uma estranha semente guardada em suas mãos pequeninas. Os últimos raios de sol invadiram a casota através da porta aberta, iluminando o ambiente e os móveis modestos da vida simples de sua família no interior de Luterra.

Arthur olhou ao redor da sala, procurando a aprovação dos seus pais. Seus pais tinham finalmente permitido que ele se aventurasse para além dos limites da sua fazenda em Luterra Oriental, e ele estava orgulhoso do resultado de uma das suas primeiras aventuras.

“O que é isso, Arthur? Uma semente?”. Seu pai perguntou.

“É, mas tem um cheiro bom!” Arthur exclamou orgulhoso. Seu pai pareceu confuso com a resposta de Arthur, deixando de fazer mais perguntas e parecendo desinteressado em uma semente tão mundana. Um momento de silêncio instalou-se pela casa até que outra voz soou no lado mais distante da sala.

“Posso?”. Arthur virou-se e viu a avó, próxima à lareira, e se aproximou imediatamente. A apatia de seu pai não foi capaz de acabar com sua empolgação.

Arthur deixou cair a semente na palma aberta da avó. Ela piscou e olhou fixamente para a semente, virando-a de um lado para o outro. Ela respirou fundo para sentir aquele aroma doce e estranhamente agradável que emanava dela. “Se isto for o que eu estou pensando, e o aroma assim me leva a crer, parece que você encontrou uma semente Mokoko. Muito rara e especial, de fato”.

“Uma semente Mokoko?”. Disse Arthur, confuso mas curioso.

“Agora, veja bem, eu nunca tinha visto uma antes. Mas ouvi as histórias lendárias. Sente-se aqui...” ela disse tocando a cadeira ao seu lado “... Vou lhe contar o que ouvi dizer sobre elas”.

“Há muito tempo, houve uma guerra contra os gigantes, e o lar deles afundou, ... chegando ao fundo do oceano. Poucos gigantes sobreviveram, e esses poucos que conseguiram, entraram em um sono longo e profundo dentro dos oceanos de Arkesia para preservar o seu poder minguante. Ouvi dizer que um dos gigantes foi denominado Tortoyk — e ele era especial, mesmo entre os gigantes. Ele herdou o poder de criar seres vivos e começou a produzir novas criaturas. Eventualmente, uma vez que Tortoyk ficara muito tempo imóvel no oceano, seu próprio corpo tornou-se o lar das suas criaturas, um ilha paradisíaca no mar”.

Arthur olhou para a avó sem conseguir acreditar. Guerra e morte não eram conceitos desconhecidos em Luterra, mesmo para uma criança, mas contos de gigantes grandes o suficiente para se tornarem ilhas — ainda mais gigantes que conseguiam criar vida — esses com certeza eram novos.

“O poder de Tortoyk foi o que criou o povo de Mokoko: a semente que agora você possui. Eu nunca vi ninguém desse povo, mas ouvi dizer que são pequenos e amigáveis, que amam a natureza e vivem na ilha até os dias de hoje. Veja bem, o único lugar onde eles podem surgir dessas sementes é na própria ilha. Quem sabe por quanto tempo a semente esperou na floresta, incapaz de germinar em Luterra”.

“Ouvi dizer que a vila Mokoko é um lindo lugar escondido e sem conflitos — e que o povo Mokoko vivia lá sem preocupações. Mas um dia, tudo mudou. Antes do gigante Tortoyk cair em seu sono profundo...” A voz da avó embargou e ela se inclinou em direção ao fogo. As chamas dançavam em seus olhos. Os olhos de Arthur, por sua vez, estavam repletos de admiração, e fixaram-se nos olhos da avó, curiosos e cativados pela história.

“AAATCHIM”, a avó gritou. Arthur recuou, surpreso, quase caindo da cadeira. A pele enrugada pareceu ainda mais proeminente no canto da boca da avó, como o prenúncio de um sorriso.

“Tortoyk espirrou com a força que apenas um gigante poderia ter. As sementes do povo Mokoko foram lançadas ao ar e espalhadas pelo vento a todos os cantos do mundo. Elas caíram em todas as partes de Arkesia e precisam ser devolvidas a Tortoyk para se transformarem no povo Mokoko”.

“Não encha a cabeça dele com esse tipo de absurdo”, o pai de Arthur esbravejou do outro lado da sala, fazendo a cerveja pular da caneca enquanto gesticulava e balançava a cabeça. A avó olhou para ele, voltou-se a Arthur, e continuou.

“Sim, tudo pode ser apenas uma história”, a avó disse. “Mas um dia, talvez, você partirá em uma aventura pelos mares e descobrirá por si mesmo”, disse ela, sorrindo mais uma vez. Ela devolveu a semente a Arthur, seus jovens olhos brilhando de esperança. Ele a pegou da mão da avó com um novo gesto em seu leve toque.